Apresentamos para você a segunda parte da série de perguntas e respostas
intitulada "Acesso ao trabalho através de concursos públicos", do livro
"Direito das pessoas com deficiência: garantia de igualdade na
diversidade", da Procuradora do Ministério Público Federal DRA. Eugênia
Augusta de Fávero. A publicação desse conteúdo foi gentilmente
autorizada pela autora e por seu editor. Ficam aqui nossos sinceros
agradecimentos a ambos. Não reproduza esse conteúdo em outras
plataformas, sem a devida autorização.
Recomendamos a leitura do livro todo, que traz conteúdo detalhado sobre
a legislação brasileira dos direitos das pessoas com deficiência, sob
diversos aspectos (trabalho, educação, assistência social, etc). A
linguagem é clara e direta, tornando a obra uma grande ferramenta em
prol da cidadania daqueles que ainda precisam lutar muito pela garantia
dos seus direitos.
Você pode, também, visitar o site da WVA Editora, através deste link.
Dividimos o capítulo em duas partes. Nesta página, disponibilizamos a
segunda parte, que contém as perguntas do número 30 ao 39; se você
quiser acessar a primeira parte, com as perguntas do número 21 ao 29, basta clicar aqui.
FÁVERO, Eugênia Augusta de. Direito das Pessoas com Deficiência:
garantia de igualdade na diversidade. Rio de Janeiro: WVA Editora, 2004.
PP.: 130-138.
Parte 2:
"[...]
30) De que forma fazer a nomeação dos candidatos, combinando-se
as duas listas?
No momento da nomeação, devem ser chamados, alternada e
proporcionalmente, os candidatos das duas listas, até o preenchimento
total das vagas. 5. Para efeito de tornar compatível o princípio da
reserva com a ordem de classificação, a convocação de forma alternada
deve iniciar-se com os candidatos da lista geral, passando-se ao
primeiro da lista especial já no primeiro bloco de convocados. 6.
Candidato com deficiência que figura nas duas listas, mas cuja
classificação permitiria que fosse chamado mesmo sem a reserva, não deve
contar para efeito desta, que, como medida afirmativa, destina-se apenas
à pessoa com deficiência que alcançou a nota mínima exigida, mas com
classificação inferior à nota de corte geral. Sempre que há reserva, há
notas de corte diferenciadas para cada lista, mas respeitando-se sempre
a nota mínima fixada no concurso.
** 5. Esse critério de convocação de forma alternada e
proporcional foi acolhido pelo Ministro Gilmar Mendes, do Supremo
Tribunal Federal, em despacho proferido em 26 de março de 2004, que
concedeu liminar no Mandado de Segurança nº. 24854. Tal Ministro acolheu
fundamento no sentido de que "a aplicação desse critério em relação aos
candidatos aprovados para o concurso implica a proporção de 19 para 1
(em concurso com aproximadamente 100 vagas e reserva de 5% dos cargos),
assegurando-se o direito de figurar como primeira colocada na lista
relativa às vagas reservadas e, por via de conseqüência, ter o direito
de escolha da sua lotação logo apos o 19º colocado na listagem geral".
6. Conforme AC 248783, TRF-4" Região, 3" Turma, DJ 18/10/2000.
**
31) E se o órgão público não for chamar todos os candidatos
aprovados de uma só vez, pode deixar para chamar os candidatos da lista
especial apenas no final?
Não. Esta prática é muito comum e, infelizmente, faz com que o
tempo do concurso se esgote, e as pessoas com deficiência acabem não
sendo chamadas. O correto é que, no primeiro bloco de convocados, já se
chame o número proporcional de candidatos que fazem parte da lista
especial. Exemplo: concurso para 100 vagas, com reserva de 5%. A cada
bloco de 20 candidatos, chama-se um candidato da lista especial. Se as
nomeações iniciais forem de apenas 10 pessoas, entre estas já deve
constar um candidato da lista especial. O próximo candidato da lista
especial será chamado apenas quando da *21ª convocação.
32) Como proceder se for convocado, inicialmente, apenas um
candidato?
A primeira convocação deve ser feita ao primeiro lugar no
concurso, por razões de mérito, mas a próxima convocação, ainda que,
novamente, seja de apenas um candidato, deve ser do primeiro lugar
constante da lista especial.
33) Como observar a reserva de vagas se o concurso for feito
para preenchimento de apenas uma vaga?
É preciso verificar se a instituição, para a qual o concurso se
destina, já tem número razoável de pessoas com deficiência em seus
quadros. Se não tiver, é possível que ela adote a reserva para essa
única vaga, com base na Constituição e na Lei 7.853/89, que determina,
especificamente aos órgãos da Administração Pública federal, tratamento
prioritário às pessoas com deficiência.
33) O que fazer quando a convocação não é feita de forma
correta?
O candidato deve entrar com mandado de segurança, através de
advogado, perante a Justiça Estadual, se for órgão público municipal ou
estadual. Perante a Justiça Federal, se for órgão
público federal. Ele deve também denunciar o fato ao Ministério Público,
pois mesmo que o promotor ou procurador não possa agir individualmente,
podem apurar as responsabilidades penais e administrativas da autoridade
competente.
34) Se a deficiência do candidato não for considerada compatível
com a função a ser desempenhado, ele pode ser impedido de tomar posse?
Não. Esta compatibilidade, ainda nos termos do Dec. 3.298/ 99,
não pode ser aferida antes da posse e exercício da função.
Ela deve ser analisada durante os estágios probatórios, que será
acompanhado pela equipe multiprofissional já mencionada (art.43, § 2º,
do Decreto 3.298/99). O seu estágio probatório, por sua vez, deve
conter as adaptações e instrumentos necessários (ledores, recursos de
informática, adaptação arquitetônica, noções de Língua de Sinais, entre
outros) para que o servidor que tem deficiência possa bem desempenhar
suas funções. Portanto, sua inscrição e /ou posse não podem ser
impedidas por este argumento.
35) Esse acompanhamento do estágio probatório, por parte de
equipe multiprofissional não implica em discriminação?
Se a finalidade do acompanhamento dessa equipe for apoiar o
desempenho das funções, facilitando a aprovação no estágio probatório,
não será discriminação, desde que o candidato aprovado não esteja
obrigado a aceitar, conforme já tivemos oportunidade de abordar neste
livro, no Capítulo 2, sobre o Direito à Não-Discriminação. No entanto,
se sua finalidade for representar um órgão a mais para o qual o servidor
com deficiência (e só ele) tem que demonstrar sua aptidão para o
exercício da função será uma diferenciação que implica em discriminação.
36) Quando determinado órgão da Administração Pública já tem
considerável número de pessoas com deficiência em exercício, ainda assim
é obrigado a observar a reserva nos concursos novos?
Depende. Caso as legislações federal, estadual e municipal,
reguladoras do inciso VIII, do artigo 37, da Constituição Federal, ao
estabelecer a reserva de seus cargos e empregos públicos fixe, como
meta, percentual mínimo destinado às pessoas com deficiência, e se esta
meta já tiver sido atingida, entendemos que o órgão fica dispensado de
observar a reserva em seus concursos, pois como toda medida afirmativa,
deve ser temporária.
37) Como aplicar a reserva, se o concurso for para cargos
estruturados por especialidades?
A distribuição das vagas reservadas será feita proporcionalmente
ao número de vagas em cada especialidade.
38) Pessoas com deficiência mental podem exercer cargos
públicos, de acesso através de concurso?
Sim, desde que passem no concurso, como todas as demais pessoas.
Algumas Prefeituras estudam a possibilidade de se prever uma espécie de
"reserva dentro da reserva", para facilitar o ingresso de pessoas com
deficiência mental, em algumas funções. No entanto, pensamos que tal
diferenciação é indevida e o correto seria, nos concursos em que os
conhecimentos teóricos são dispensáveis, não haver a exigência de
comprovação de escolaridade através de certificado, atribuindo-se maior
peso aos resultados obtidos nas provas práticas.
39) A quem cabe contratar ajudantes para a pessoa com
deficiência (exemplo: ledor, auxiliar para higiene pessoal etc.)?
O auxílio necessário para o desempenho das funções do trabalho
deve ser providenciado pelo empregador, o que pode ser feito através de
revezamento de pessoas que ocupam funções consideradas auxiliares. Já o
apoio necessário para cuidados pessoais, a nosso ver, deve ficar a cargo
do próprio trabalhador com deficiência.
[...]"